27 de dezembro de 2010

TESES SOBRE FEUERBACH

Karl Marx

I -

O defeito fundamental de todo materialismo anterior - inclusive o de Feuerbach - está em

que só concebe o objeto, a realidade, o ato sensorial, sob a forma do objeto ou da

percepção, mas não como atividade sensorial humana, como prática, não de modo

subjetivo.

Daí decorre que o lado ativo fosse desenvolvido pelo idealismo, em oposição

ao materialismo, mas apenas de modo abstrato, já que o idealismo, naturalmente, não

conhece a atividade real, sensorial, como tal. Feuerbach quer objetos sensíveis, realmente

diferentes dos objetos de pensamento; mas tampouco concebe a atividade humana como

uma atividade objetiva. Por isso, em A Essência do Cristianismo, só considera como

humana a atividade teórica, enquanto a prática somente é concebida e

fixada em sua manifestação judia grosseira. Portanto, não compreende a importância da

atuação "revolucionária", prático-crítica.

II-

O problema de se ao pensamento humano corresponde uma verdade objetiva não é um

problema da teoria, e sim um problema prático. É na prática que o homem tem que

demonstrar a verdade, isto é, a realidade, e a força, o caráter terreno de seu pensamento.

O debate sobre a realidade ou a irrealidade de um pensamento isolado da prática é um

problema puramente escolástico.

III -

A teoria materialista de que os homens são produto das circunstâncias e da educação e de

que, portanto, homens modificados são produto de circunstâncias diferentes e de

educação modificada esquece que as circunstâncias são modificadas precisamente pelos

homens e que o próprio educador precisa ser educado. Leva, pois, forçosamente, à

divisão da sociedade em duas partes, uma das quais se sobrepõe à sociedade (como, por

exemplo, em Robert Owen). A coincidência da modificação das circunstâncias e da

atividade humana só pode ser apreendida e racionalmente compreendida como prática

transformadora.

IV -

Feuerbach parte do fato da auto-alienação religiosa, do desdobramento do mundo em um

mundo religioso, imaginário, e outro real. Sua tarefa consiste em decompor o mundo

religioso em sua base terrena. Não vê que, uma vez realizado esse trabalho, o principal

continua por fazer. Na realidade, o fato de que a base terrena se separe de si mesma e fixe

nas nuvens um reino independente só pode ser explicado através da dilaceração interna e

da contradição desse fundamento terreno consigo mesmo. Este último deve, portanto,

primeiro ser compreendido em sua contradição e em seguida revolucionado praticamente

mediante a eliminação da contradição. Por conseguinte, depois de descobrir, por exemplo

na família terrena o segredo da sagrada família, é preciso criticar teoricamente aquela e

transformá-la praticamente.

V -

Não satisfeito com o pensamento abstrato, Feuerbach recorre à percepção sensível. Não

concebe, porém, a sensibilidade como uma atividade prática, humano-sensível.

VI -

Feuerbach dilui a essência religiosa na essência humana. Mas a essência humana não é

algo abstrato, interior a cada indivíduo isolado. É, em sua realidade, o conjunto das

relações sociais.

Feuerbach, que não empreende a critica dessa essência real, vê-se, portanto, obrigado

1- a fazer caso omisso da trajetória histórica, fixar o sentimento religioso em si mesmo e

pressupor um indivíduo humano abstrato, isolado;

2 - nele, a essência humana só pode ser concebida como "espécie", como generalidade

interna, muda, que se limita a unir naturalmente os muitos indivíduos.

VII -

Feuerbach não vê, portanto, que o "sentimento religioso" é, também, um produto social e

que o indivíduo abstrato que ele analisa pertence, na realidade, a uma forma determinada

de sociedade.

VIII -

A vida social é essencialmente prática. Todos os mistérios que desviam a teoria para o

misticismo encontram sua solução racional na prática humana e na compreensão desta

prática.

IX -

O máximo a que chega o materialismo perceptivo, isto é, o materialismo que não concebe

a sensibilidade como uma atividade prática, é a percepção dos diferentes indivíduos

isolados da «sociedade civil".

X -

O ponto-de-vista do antigo materialismo é a sociedade "civil"; o do novo materialismo, a

sociedade humana ou a humanidade socializada.

XI -

Os filósofos não fizeram mais que interpretar o mundo de forma diferente; trata-se porém

de modificá-lo.

Escrito por Marx durante a primavera do 1845. Redigido e publicado pela primeira vez

em 1888, por Engels como apêndice da edição em folheto à parte de seu Ludwig

Feuerbach. Publica-se de acordo com o texto da edição em folheto à parte, de 1888,

após confronto com o manuscrito de Marx. Traduzido do espanhol.